Quase não
acreditaram quando viram o mestre e seus seguidores entrando em sua casa para o
jantar. O marido nem se importou de ficar sem lugar na mesa porque, no fundo,
só pensava fazer inveja aos vizinhos. A mulher ficou na cozinha, mais
preocupada com a louça cara que iriam usar. Durante a refeição não ouviam direito
as palavras do líder que, sentado bem ao centro, falava de um modo muito
plácido. Mas ouviram quando ele ergueu
diante dos olhos o cálice que estava à sua frente e disse: tomai, este é o meu
sangue!O marido se assustou; não podia ver sangue. A mulher só pensou se
aquilo mancharia o cálice. Em seguida, ele anunciou que um dos
seus iria traí-lo. Todos duvidaram, alvoroçados. O casal, ainda na cozinha,
tentou adivinhar. Pra mim é esse que tá no lado direito dele, todo solícito,
disse o marido, os bonzinhos são os piores. A mulher preferiu apostar no
discípulo mais calado, intuição feminina.Tarde da noite, foram-se todos,
alimentados e agradecidos. A mulher, não se contendo, correu examinar o cálice usado pelo mestre. Ficou
aliviada quando viu que nele não havia sangue, mas apenas vinho.
(Extraído do livro "As coisas que chamo de nossas")